Os primeiros oito meses de Alê Youssef na secretaria de Cultura
Reforço do calendário de eventos e polêmicas com ex-funcionários marcam a gestão. Quando o assunto é o próximo Carnaval, ele se esquiva de uma pergunta
Nas últimas semanas, o Teatro Municipal voltou a roubar a cena. Dessa vez, funcionários responsáveis por analisar as contas do Instituto Odeon, encarregado da gestão do complexo, foram demitidos depois de mostrar a reprovação de parte dos balanços. “Não foi retaliação: a avaliação técnica tinha acabado. Agora, tem gente que perdeu o emprego e está recalcada, fica atirando para todos os lados”, diz o secretário de Cultura, Alê Youssef. O estilo informal dá lugar ao tom político para explicar o futuro da importante casa de ópera municipal, que aguarda ainda o prazo final para a organização apresentar dados. “Se as contas do Odeon forem reprovadas depois da entrega da documentação pedida, ele não poderá participar do próximo edital. Caso sejam aprovadas, estará apto.”
Youssef assumiu a pasta em janeiro, substituindo André Sturm, que teve sua saída anunciada justamente por causa da celeuma com o Municipal. Logo de cara, precisou lidar com eventos de grande porte, como a Virada Cultural. Realizada em maio, ela atraiu o seu maior público: 5 milhões de pessoas. Mas os altos cachês foram alvo de críticas. “Fizemos uma edição mais plural com praticamente o mesmo valor do ano passado. A meu ver, trata-se de um investimento”, diz. Segundo a Secretaria, foram gastos 18 milhões de reais, que geraram um retorno de 235 milhões de reais para a cidade. Aumentar a movimentação dos teatros e centros culturais é, assim como ampliar a receita, um desafio.
Em julho, o então secretário adjunto da Cultura, Aldo Valentim, deixou a pasta. “Espero que um dia São Paulo volte a ter um secretário de Cultura, e não um produtor de eventos”, disse em entrevista na época. “Eu deixo para a própria população refletir sobre o que era antes, o que é agora e o que pode ser depois”, afirma Youssef. “Tenho uma visão muito clara, que aprendi com amigos. Juntos, fundamos o (bloco Acadêmicos do) Baixo Augusta. A cidade ocupada é uma cidade mais humana”, diz.
Xodó de Youssef, o bloco criado há dez anos passou a ser dirigido por Ale Natacci quando seu fundador assumiu o cargo público. Ainda na região do Baixo Augusta, o paulistano de 44 anos comandou a casa de shows Studio SP, fechada em 2013. Ele aposta nas ocupações culturais para incentivar o setor. Previsto para até o fim deste mês, um fomento para coletivos culturais que atuam em áreas periféricas deverá ter prêmio máximo de 50 000 reais por projeto.
Nos bastidores tucanos, a nomeação de Youssef foi lamentada como a “entrega da Cultura ao PT”. Mas ele já teve uma vida política eclética. Foi assessor no Ministério da Justiça de FHC, coordenador de Juventude da prefeita Marta Suplicy (PT), candidato a deputado federal pelo PV em 2010 (não se elegeu) e um dos fundadores da Rede. Saiu do movimento Agora!, criticando a aproximação do grupo com Luciano Huck.
Amigo de artistas, Youssef viu sua rotina mudar bastante nos últimos tempos. Para suprir a falta da academia, decidiu cortar o arroz do filé à parmigiana do almoço e começou a ir andando de Higienópolis, onde mora, até o gabinete, próximo ao Viaduto do Chá. O dia a dia apertado também exigiu ajustes na rotina de visitas da filha, de 5 anos, do seu relacionamento com a atriz Leandra Leal, que mora no Rio de Janeiro. “Foi bem difícil para mim no início não conseguir vê-la. Agora, eu me organizei no bate e volta e ela vem para cá também”, suspira o pai.
Para o ano que vem, Youssef terá sob o seu guarda-chuva a gestão do Carnaval de rua, incluindo o chamamento dos blocos. Haveria algum dilema ético ou brecha para favorecimento? “Que pergunta vil”, disse. Contrariado, levantou-se e deu por encerrada a entrevista.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 11 de setembro de 2019, edição nº 2651.