Com frases de efeito, Maurício Lopes não foge de uma polêmica
Personagem de casos envolvendo Tiririca e cassações de mandato, promotor compara moradores de Pinheiros a nazistas
Quando souberam que um albergue municipal será transferido para o número 1968 da Rua Cardeal Arcoverde, em Pinheiros, alguns moradores e lojistas do bairro, sentindo-se incomodados, decidiram se mobilizar contra a iniciativa. Prepararam um abaixo-assinado com 1.104 nomes no qual dizem que a população local ficará “acuada em suas residências” pelos sem-teto e que, por isso, o “comércio provavelmente não vai sobreviver”.
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O passo seguinte foi encaminhar o documento ao Ministério Público, no qual esperavam encontrar apoio para barrar o projeto. Pois o efeito acabou sendo o inverso. O promotor Maurício Lopes, que recebeu a carta, não só negou o pedido como encaminhou o manifesto para a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), em acusação destemperada, na qual, com grande exagero, compara os signatários a nazistas. “Tal demonstração de insensibilidade é de provocar inveja a qualquer higienista social do Terceiro Reich”, escreveu. A reação desproporcional assustou os envolvidos, que de pedra passaram a vidraça, mas não foi surpresa para quem conhece o estilo Lopes. Aos 49 anos de idade e com 24 de carreira pública, dono de pavio curto, ele é um dos nomes mais polêmicos e barulhentos da promotoria em São Paulo.
Uma de suas características é produzir frases de efeito. “Tratam os pobres como se fossem pombos”, diz. “Nesse caso da Cardeal, me chocou a falta de pudor em demonstrar a discriminação”, continua, abrindo em seguida um sorriso ao mostrar uma dezena de e-mails de cidadãos (cerca de 1% dos que firmaram o abaixo-assinado) em apoio a suas declarações. A vice-prefeita Alda Marco Antonio, responsável pela Secretaria de Assistência Social, endossa. “Também vejo preconceito nessa rejeição”, diz ela, reafirmando que o albergue abrirá as portas em dezembro. No meio jurídico, enquanto isso, a discussão é outra: o promotor não estaria cerceando o direito de reclamar? Para o advogado dos envolvidos, Luiz Carlos Tucho, trata-se de uma atuação abusiva. “As pessoas se expressaram pelos meios oficiais, não pegaram mendigo com porrete”, afirma Tucho, que espera a delegacia decidir se vai investigar o grupo.
O mais velho de quatro filhos de uma professora e um industriário, Lopes fez o ensino fundamental em escola pública, o médio no Colégio Bandeirantes e graduou em direito pela USP. Com um reluzente brinquinho na orelha esquerda e um toque de celular que simula um assovio fantasmagórico, não costuma passar despercebido. Nem tenta. “Não procuro a polêmica, mas também não fujo dela.” Em muitas ocasiões, porém, tomou posição por vontade própria, quando o assunto já pegava fogo. Foi assim ao cobrar testes de alfabetização de Francisco Everardo Silva, o Tiririca, já na reta final da eleição para deputado federal, em 2010.
O candidato foi aprovado, apesar de ter ficado clara sua dificuldade em ler uma cartilha ou escrever algumas palavras. Já o promotor acabou alvo de processo administrativo do Conselho Nacional do Ministério Público ao declarar que o humorista era um “estelionato eleitoral”. Para o conselheiro Bruno Dantas, essa postura foi “incompatível com os princípios do estado de direito”, como a “impessoalidade”. Em outra ocasião, virou tema de nota de repúdio da Ordem dos Advogados do Brasil ao falar em entrevista que “advogado é sórdido”.
Se a língua continua uma navalha, as orelhas de Lopes (inclusive a do brinquinho) costumam ferver. Um dos episódios mais lembrados pelos que o conhecem é a acusação de que plagiou em tese de livre-docência pela USP o trabalho de um colega, em processo já arquivado. “Meu erro foi me esquecer de dar o crédito”, justifica. “Não são três páginas que vão manchar minha biografia.” Há, porém, uma série de entusiastas de seu perfil barulhento. Na Promotoria de Habitação, onde está desde fevereiro (antes, passou pelo Primeiro Tribunal do Júri, em casos como o do Primeiro Comando da Capital), os outros cinco membros o elegeram secretário executivo, uma espécie de representante da equipe. “Ele é populista, mas toma medidas enérgicas em casos que precisam sair da letargia”, diz um colega.
Um bom exemplo disso se deu na semana passada, quando Lopes tratou das enchentes paulistanas. Anunciou que, a partir deste ano, processará o prefeito da cidade por improbidade administrativa quando o alagamento se repetir em ponto conhecido. “Vamos ver se por medo da ficha suja alguém toma alguma providência”, afirma, assumindo que dificilmente um gestor acabaria condenado por isso. Fã de biografias e livros sobre guerra, e cinéfilo contumaz, ele compara: “É como disseram uma vez para o Indiana Jones: não é porque lutar pelo que você acredita não deu certo que você vai deixar de fazê-lo”. E ele não deixa, mesmo quando a razão e o bom-senso não estão ao seu lado.
Outros casos em que o promotor fez barulho
Alfabetização de Tiririca
Quando promotor eleitoral, Maurício Lopes solicitou em juízo que o então candidato a deputado federal Francisco Everardo Silva, o Tiririca, provasse que sabia ler. Após declarar que seguir com o caso seria uma “questão de honra” e que o comediante era um “estelionato eleitoral”, acabou alvo de um processo disciplinar do Conselho Nacional do Ministério Público, ainda não concluído, por violação de princípios como “ampla defesa” e “impessoalidade”
Desapropriações na Cracolândia
Em inquérito atual, acompanha as decisões sobre a revitalização da região. Uma de suas principais cobranças é um plano melhor para quem já vive nos cortiços e prédios da área degradada. “Essas pessoas não podem simplesmente ser varridas de de lá”
Cassações em massa
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Também trabalhando nas eleições, conseguiu em 2010, em primeira instância, a suspensão do mandato do prefeito Gilberto Kassab e de treze vereadores acusados de receber doações ilegais na campanha. O Tribunal de Justiça reverteu a decisão. “Eu sabia que não seria fácil, mas as causas difíceis é que dão sabor à vida”
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