Concessionária de Viracopos contrata “diplomata” para sair da crise
Aeroporto de Campinas foi cedido à iniciativa privada em 2012 e aposta em advogado para salvar complexo da falência
Em meio a uma novela que se arrasta há mais de dois anos, o consórcio que desde 2012 administra o Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas, deu a última cartada para tentar salvá-lo da falência e permanecer no controle do complexo. Formada pelas empresas UTC Participações, Triunfo Participações e Investimentos e Egir, a concessionária Aeroportos Brasil resolveu apostar na contratação de uma espécie de diplomata, cuja meta é acabar com a guerra judicial travada entre o consórcio e o governo federal, que cedeu a estrutura à iniciativa privada.
Especializado em direito público e em arbitragem, o escritório do advogado Gustavo Justino de Oliveira entrará em cena com a dura missão de atenuar o litígio de um processo que pode culminar no colapso financeiro de Viracopos, o segundo maior aeroporto de cargas do Brasil e o sexto em transporte de passageiros (até outubro, quase 9 milhões de pessoas embarcaram ou desembarcaram por lá). Ele foi um dos primeiros aeroportos de grande porte a ter seu comando transferido para a iniciativa privada.
Depois que passou a ser operado pelo consórcio, Viracopos mergulhou em uma crise da qual não conseguiu mais sair, abalando os pilares de um casamento caro: um contrato de quase 13 bilhões de reais. “Temos de melhorar a relação entre as partes. Está muito desgastada”, afirma Justino. Desde que ganhou o direito de operar Viracopos e de explorá-lo comercialmente por trinta anos, a operadora viu as dívidas atingir a casa dos 5 bilhões de reais. Para a concessionária, o responsável por isso é o próprio governo federal, que não teria entregue um terreno de 17 milhões de metros quadrados previsto no contrato. “Essa área poderia ser destinada à construção de hotéis, shoppings e centros de convenção. E aumentaria nossa receita em mais de 1 000%”, explica Gustavo Salgueiro, advogado e porta-voz do consórcio.
Até agora, segundo Salgueiro, a União entregou apenas 20% do prometido. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que regula o setor, nega o fato e diz que o contra to prevê a entrega da área em até trinta anos. Além de ter recorrido à Justiça para acessar o terreno, o consórcio entrou com um pedido de recuperação judicial em 2018. A assembleia entre a Aeroportos Brasil e seus credores (bancos e fornecedores) será em 16 de dezembro. Do outro lado do balcão, a Anac também tomou suas providências e entrou com um processo para cassar a concessão de Viracopos, o que obrigaria a União a relicitar o contrato. “Anunciar uma medida dessas é colocar uma faca no pescoço da operadora. Se não houver diálogo para encontrar alternativas, qual mensagem o governo passará ao mercado?”, questiona o advogado Justino.
Em reuniões com representantes da Anac, a concessionária tem tentado convencer o governo a não suspender o contrato, sob o argumento de que essa medida geraria prejuízos ainda maiores aos cofres públicos — cerca de 53 milhões de reais mais o valor da indenização a ser pago ao atual consórcio, de acordo com um estudo apresentado pelas empresas à Anac. A tendência, porém, é que o plano de procurar novas empresas para operar Viracopos seja mantido. “O processo de caducidade da concessão tramita normalmente”, diz o órgão.
Justino pretende agendar encontros com representantes da Anac nos próximos dias, a fim de tentar fazer com que a agência mude de ideia a partir de um novo modelo de negociação. “A administração não pode virar as costas para seu parceiro. Queremos uma solução amigável”, afirma Justino, que ganhou fama atuando como árbitro especializado em casos que envolvem infraestrutura. Ele também é professor de direito administrativo da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 04 de dezembro de 2019, edição nº 2663.