SalveZooSP: movimento luta contra extinção da Fundação Zoológico
Instituição é responsável por conservação de espécies ameaçadas; governo afirma que funções da Fundação serão transferidas para secretaria do verde
A Assembleia Legislativa de São Paulo discute o projeto de lei (PL) 529/2020 (saiba mais ao final do texto). De autoria do governo estadual, o texto propõe, além de mudanças no orçamento das universidades públicas paulistas, a extinção de uma série de instituições estaduais, como a Fundação Zoológico de São Paulo.
Contrárias à proposta do estado, várias personalidades da sociedade civil se uniram no movimento SalveZOOSP, que questiona nas redes sociais o governo estadual quanto ao futuro da Fundação. Aqui cabe uma ressalva: a fundação administra o parque zoológico. Caso o projeto seja aprovado, significa o fim dele? Não. O espaço com a visitação de animais será concedido para a iniciativa privada, algo que foi aprovado pela Alesp e sancionado pelo governo Doria em 2019.
A Fundação, além da administração do zoo, tem na sua alçada uma série de programas de pesquisa voltada para conservação de espécies ameaçadas de extinção, a principal preocupação do pessoal do SalveZOO. De acordo com o governo estadual, os programas de pesquisa e conservação não serão extintos, mas ainda não há uma definição clara de como será feita a transição, caso o PL seja aprovado.
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“Frequento o zoológico desde os 14 anos”, diz o médico e ambientalista Elias Sadalla Filho, 53. “Boa parte das pessoas vê o local apenas como um ambiente que mantém animais presos. Mas tem o lado do zoológico moderno: pesquisa, reprodução de espécies ameaçadas, projetos pra reintrodução na fauna de animais de cativeiros, teses e mestrados do pessoal de zoologia e biologia”, explica.
“Hoje um zoológico tem que estar envolvido na geração de conhecimento. Existem muitos animais que não estão na área de visitação, mas que são mantidos e reproduzidos”, diz Claudia Igayara, presidente da Associação de Zoológicos e Aquários do Brasil. Ela conta que atualmente a Fundação Zoológico é responsável pela gestão de doze programas de conservação de espécies ameaçadas. “Ararajuba, jandaia sol, cágado-de-hogei, perereca-pintada, mico-leão-de-cara-dourada…”, cita Claudia.
O texto de autoria do governo tucano não especifica qual será o futuro dos funcionários e pesquisadores da Fundação, apenas afirma que as atividades de pesquisa serão transferidas para a administração. “O PL não é claro sobre o que aconteceria. O que nos preocupa é que não existe uma definição, o governo não explica”, critica Claudia Igayara, presidente da Associação de Zoológicos e Aquários do Brasil.
“A proposta [PL 529/2020] é geral. Não foi feita olhando para uma ou outra entidade. É um conjunto de esforços para diminuir gastos, sem prejuízo destes serviços”, diz o subsecretário estadual de meio ambiente, Eduardo Trani. “Há alguns anos não temos capacidade de investimento para melhorar um serviço público tão importante [Fundação Zoológico]”.
O saldo das contas da Fundação foi negativo nos últimos três anos. De acordo com o balanço anual divulgado pela própria instituição, em 2019 foram 3,01 milhões de reais de déficit na operação; 2018, 4,8 milhões e, em 2017, 4,6 milhões de reais.
O público no Zoológico também teve altos e baixos. Em 2016 foram 1,4 milhão de visitantes; em 2017, 1,3 milhão. 2018 fechou com 974 456 e o ano passado, 2019, teve um aumento, totalizando 1,14 milhão de pessoas.
“Não é só o fato de termos entre 3 e quase 5 milhões de déficit. Mas compõe uma estratégia [o fim das instituições]”, diz Trani. “A lei é apenas autorizativa, não quer dizer que se for aprovada amanhã a Fundação vai ser encerrada”, diz o subsecretário. O texto prevê um prazo para o fim das entidades: 6 meses, que pode ser estendido para até 18 meses.
“Estamos estudando a possibilidade de transferência de parte desses funcionários [da Fundação] para fazer a gestão desses programas de conservação de fauna. Vamos precisar de funcionários especializados”, afirma Trani. De acordo com o subsecretário, as pesquisas e a fiscalização da concessão do Zoológico serão atribuições da Secretaria Estadual de Infraestrutura e Meio Ambiente.
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A concessão
O Zoológico e o Jardim Botânico serão concedidos para a iniciativa privada. A lei aprovada em julho de 2019 prevê que a Fundação Zoológico seja a responsável pela fiscalização da entidade que administrará o endereço. “Com o fim da Fundação, quem vai fiscalizar?”, questiona Igayara. “A administração direta, a secretaria vai assumir esse papel”, afirma Trani.
O edital de concessão está sendo elaborado pelo governo estadual. A previsão é que ele seja publicado ainda no segundo semestre de 2020. “Parte dos recursos dessa concessão, parte da outorga [valor pago pela entidade privada para o governo estadual], virá para a gestão de pesquisas e os programas de concessão de fauna ameaçada”, afirma Trani.
Confusão na Alesp
O projeto de lei tramita na Assembleia Legislativa. Na noite de quarta-feira (30) ele chegou a entrar em votação, mas não passou por falta de votos. Deputados estaduais do PT, Novo, PC do B, PSL, PSB, PSOL, PTB, PSD, PROS, REDE e Patriota obstruíram (ou seja, não registraram voto) a sessão. O projeto voltou então para a fase de discussão.
Nos discursos de plenário de quarta, chamou a atenção a união de políticos de diferentes espectros dialogando para tentarem impedir a aprovação do PL do governo tucano. Arthur do Val (Patriota), Erica Malunguinho (PSOL), professora Bebel (PT) e Gil Diniz (PSL) foram algumas das figuras que se destacaram por tecerem críticas ao projeto de lei.
“Veja o que o PSDB faz. Tem gente que eu quase não dou bom dia e estamos aqui tentando impedir que esse PL passe”, disse Val durante a sessão plenária.
A votação de quarta também teve muita confusão. O deputado Coronel Telhada (PP) presidia a sessão, por pedido de Cauê Macris (PSDB), na justificativa de que o tucano, que é presidente da Alesp, não estaria no plenário no início da sessão. Depois de muita gritaria da oposição, Telhada foi verificar a gravação de vídeo da Casa e as filmagens mostravam que Macris estava no recinto. Após uma suspensão, o tucano assumiu a presidência da sessão.
O PL 529/2020
O projeto de lei é alvo de polêmica por prever a extinção das seguintes entidades estaduais:
- Fundação Parque Zoológico de São Paulo
- Fundação para o Remédio Popular Chopin Tavares de Lima (FURP)
- Fundação Oncocentro de São Paulo
- Instituto Florestal
- Companhai de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo (CDHU)
- Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU)
- Superintendência de Controle de Endemias (SUCEN)
- Instituto de Medicina Social e de Criminologia (IMESC)
- Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (DAESP)
- Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (ITESP)
Na maioria dos casos o texto não especifica se os funcionários das instituições serão demitidos ou incorporados à administração direta, ou seja, secretarias do governo estadual. Outro ponto polêmico é a mudança na gestão do orçamento das universidades estaduais.
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O 14º artigo prevê que o superávit financeiro de autarquias e fundações estaduais seja direcionado para o tesouro estadual ao final de cada exercício. O montante seria usado para o pagamento de aposentadorias e pensões do regime próprio de Previdência Social do Estado. A medida impactaria fundos da USP, Unesp e a Unicamp, com a transferência da reserva de caixa dessas instituições que seria usada para pesquisas. De acordo com o governo, o PL tem como objetivo viabilizar medidas para o enfrentamento dos “efeitos negativos da pandemia da Covid-19 sobre as receitas públicas”: a gestão prevê um déficit orçamentário de 10,4 bilhões de reais em 2021.
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