Futuro em votação: projeto pretende transformar Jockey Club em parque
Local deve milhões em impostos à prefeitura; projeto avança na Câmara
Um projeto que avança rapidamente na Câmara Municipal pretende transformar em parque o Jockey Club de São Paulo, fundado há 147 anos e localizado desde 1941 às margens da Marginal Pinheiros, na Cidade Jardim.
Em menos de um mês, a proposta foi protocolada pelo vereador Milton Leite (União) — reeleito presidente da Casa em dezembro — e aprovada em primeiro turno. Ainda precisa ser validada em uma segunda apreciação. O clube se diz surpreendido pela investida e critica uma suposta “falta de discussão prévia” do assunto. Ao mesmo tempo, briga com a prefeitura na Justiça em ações milionárias ligadas a impostos e à venda de um terreno para a cidade.
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Sem o glamour de outrora, os mais de 600 000 metros quadrados do Jockey ainda são usados em corridas de cavalos, como clube social e para a realização de eventos — já abrigou festivais como o Lollapalooza. Na última década, ele se viu afundado em dívidas tributárias. Em 2014 firmou um acordo com a prefeitura para quitar parte delas, cedendo um terreno na Vila Sônia para virar o atual Parque Chácara do Jockey.
A agremiação alega que não recebeu todo o valor acordado (que, atualizado, seria de 110 000 000 reais), se recusa a pagar o IPTU e diz que já cumpre função de parque porque “as dependências são abertas ao público”. O destino do espaço é incerto, tanto pelo caminhar da proposta quanto por conta de um Projeto de Intervenção Urbana (PIU) que tramita no Executivo para revitalizar a área. Entre 2019 e 2021, o Legislativo fez consultas e audiências públicas no âmbito do PIU nas quais cidadãos e instituições deram ideias sobre o que seria feito ali. Mas o processo segue em fase inicial.
As discussões voltaram à tona em 16 de novembro, quando Leite protocolou o projeto que declara o espaço como de utilidade pública para ser transformado em parque. A proposta avançou com velocidade de cavalo vencedor: após uma audiência pública no dia 6 sem nenhuma manifestação dos presentes, foi aprovada no dia seguinte em primeiro turno em uma votação que durou poucos segundos. Só então os diretores do Jockey, segundo alegam, ficaram sabendo do projeto.
“Não fomos procurados em nenhum momento, nem para a primeira audiência pública fomos convidados”, reclama José Carlos Pires, diretor do hipódromo. Sucinto, o projeto prevê apenas a desapropriação para posterior transformação em parque. A eventual implementação caberia a um projeto mais detalhado do Executivo. Urbanistas como Alexandre Delijaicov veem com otimismo a proposta. “Um parque de frente para o Rio Pinheiros se tornará uma área verde fluvial importantíssima. Se for encadeado ao Parque Bruno Covas (às margens do rio], será ainda melhor. Os edifícios atuais podem abrigar museus”, ele diz.
Outro urbanista, Renato Cymbalista, pondera que é preciso analisar o custo. Pela lei das desapropriações, o Jockey precisará receber uma indenização financeira. Ainda que se descontem os 313 332 784 reais em IPTU devidos pela instituição, a avaliação do imóvel ultrapassa 1 bilhão de reais em valor venal — e, nos cálculos do clube, varia de 70 bilhões a 80 bilhões no mercado. “A prefeitura precisa pensar no que é prioritário. Com 1 bilhão de reais, você pode comprar áreas em Parelheiros para fazer parques e obras que interfeririam de fato no abastecimento de água da cidade”, afirma.
“A região já tem parques e não deveria ser prioridade”, opina o urbanista e ex-vereador Nabil Bonduki. Na audiência do dia 12, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente da cidade mostrou ressalvas sobre a ideia do parque. “A gestão prioriza áreas mais vulneráveis e carentes, o que não é o caso, afinal, não faltam áreas verdes na região”, diz Teresa Maria, que representou a pasta. Em um raio de 2 quilômetros, existem o Parque Alfredo Volpi (no Morumbi), o Parque do Povo (no Itaim Bibi) e o próprio Parque Bruno Covas — e em menos de dez minutos de carro está a Cidade Universitária da USP, amplo espaço verde aberto ao público, além dos parques Villa Lobos e Cândido Portinari.
“Caso a área seja definida pública, a pasta incluirá em seu planejamento a elaboração de um projeto para o uso do espaço e divulgará com a transparência de praxe”, afirma em nota a secretaria. O Jockey questiona o IPTU por entender que deveria pagar o ITR (sobre Propriedade Territorial Rural) devido às atividades de criação de cavalos e turfe, e que, por ser uma agremiação esportiva, seria isento do imposto municipal.
A Lei 6989/1966, que prevê que os clubes esportivos não pagam IPTU, excetua do benefício os poules, ou talões de apostas — exatamente o caso do hipódromo. O processo tramita na Justiça. A Procuradoria-Geral do Município diz que aguarda a decisão do Judiciário. ■
Publicado em VEJA São Paulo de 28 de dezembro de 2022, edição nº 2821
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