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Artigo: As lições de políticas públicas e inovação social de Medellín

Entre elas, que a transformação teve o apoio de todos, governo, iniciativa privada, academia e sociedade, afirma Edu Lyra, da Gerando Falcões

Por Edu Lyra
Atualizado em 27 Maio 2024, 20h57 - Publicado em 8 jan 2021, 06h00
Imagem de um teleférico sobrevoando uma comunidade de Medellín
Teleférico sobrevoando comunidade de Medellín, na Colômbia (Getty Images/Reprodução)
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Nascido numa favela em Guarulhos, trabalho com meu time para que a pobreza se transforme em peça de museu. E queremos fazer isso antes de o empresário Elon Musk pousar seu foguete em Marte.

Como parte do nosso projeto de Redesenho de Favela, em São José do Rio Preto, onde vamos construir a primeira comunidade inteligente e autossustentável do Brasil, embarquei para Medellín, numa jornada de aprendizagem com os colombianos.

A expedição foi liderada por Murilo Cavalcanti, secretário de Segurança Urbana do Recife, uma pessoa que cuida de bibliotecas públicas, decidiu não armar a Guarda Civil e criou o Centro Comunitário da Paz (Compaz), um dos principais aparelhos públicos do Brasil, tido como uma fábrica de cidadania.

Houve um tempo em que Medellín era a face assustadora de uma distopia social. Os males se acumulavam: Pablo Escobar, corrupção crônica, Cartel de Medellín, Farc, assassinatos, sequestros, medo, guerra civil, toque de recolher às 18 horas. Foi a cidade mais violenta do mundo, com 382 assassinatos para cada 100 000 habitantes. O inferno parecia não ter fim.

Mas teve. Os colombianos fizeram uma revolução social. Meus amigos Germano Guimarães (fundador e CEO do Instituto Tellus) e Rafael Hawilla (empresário e patrocinador da viagem) e eu vimos o melhor da política pública a serviço dos mais pobres.

A Comuna 13 — o centro nervoso do terror, a região mais violenta da cidade — tornou-se um laboratório a céu aberto de políticas públicas e inovação social. Uma integração de tecnologias que eles chamam de “acupuntura social”. Moradias comunitárias, casa de Justiça, saneamento básico, água potável, biblioteca-parque, quadra poliesportiva, calçada alargada, escada rolante e o metrocable — o sistema de teleféricos conectado a um eficiente metrô.

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Em outras áreas, houve a revitalização de espaços públicos. Avenidas foram devolvidas a pedestres, construíram-se galerias de arte e museus. Colocaram de pé o Ruta N, um centro de inovação e negócios focado em melhorar a qualidade de vida do cidadão por meio da ciência e da tecnologia.

Por causa da integração de políticas e tecnologias sociais, é possível dizer que os pobres de Medellín são menos pobres que os demais pobres da América Latina. A bomba-relógio foi desarmada. E Medellín, merecidamente, foi eleita a cidade mais inovadora do mundo, vencendo Nova York e Tel Aviv, em competição realizada pelo Instituto Urband Land. A mais impressionante reviravolta urbana dos tempos modernos.

A pergunta central é: como isso aconteceu?

Murilo Cavalcanti nos apresentou ao ex-secretário de Desenvolvimento Social de Medellín Jorge Melguizo. Andando pelas ruas, em horas de aula, ele nos mostrou o caminho das pedras, onde se destacam seis pilares.

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1 — Acordo social. Uma sociedade pode estar em desacordo na solução, mas não na identificação do problema. Medellín produziu um pacto social sobre o que era crucial: vencer a violência. Se não tivessem nitidez sobre o problema, jamais chegariam à solução.

2 — Pertencimento. A revolução de Medellín não tem dono. Não foram os gringos. Muito menos um grupo iluminado. A transformação teve o protagonismo de todos: governo, comunidade, iniciativa privada, academia, ONGs etc. Um empresário disse que o melhor investimento da iniciativa privada foi em políticas públicas de educação.

3 — Convivência. O contrário de insegurança não é segurança — é convivência. Se a sociedade não convive nos espaços públicos, esse território não é seguro. Não é o Exército na rua que promove sensação de segurança.

4 — Cidadania. Os arquitetos da transformação não construíram prédios. Construíram cidadania. Mais do que erguer uma cidade, ergueram uma sociedade. Todo espaço público precisa cumprir um papel social.

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5 — Dignidade. A cidade deixou de entregar coisa ruim para pobre. A mesma qualidade da calçada alargada do centro de Medellín está presente nas comunas, onde não se sente o cheiro de esgoto, mas o aroma do pão doce. Lá, nenhum indivíduo vale mais que outro. O privilégio de poucos cedeu lugar ao direito de todos.

6 — Longo prazo. Não há fast-food social. Quase nada realmente grande foi feito a toque de caixa. Medellín não mudou da noite para o dia. Foram vinte anos de trabalho. Como o processo é longo, há que começar logo.

Curiosamente, aprendemos com os colombianos o que eles haviam aprendido com brasileiros, ao buscar referência no transporte de Curitiba e no Favela Bairro no Rio de Janeiro. Hoje o Museu da Memória da Violência, que os colombianos construíram, é um lembrete do passado recente. Não foi um processo simples, mas certamente foi menos complexo do que uma viagem a Marte. Diferentemente do projeto espetaculoso de exploração espacial, a transformação social está ao alcance de nossas mãos.

Imagem de Edu Lyra sentado em uma cadeira
ONG Geraldo Falcões, que atende 1.200 famílias na periferia da Grande São Paulo. Eduardo Lyra, criador da ONG. (Alexandre Battibugli/Veja SP)
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Edu Lyra é empreendedor social e fundador da Gerando Falcões.

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Publicado em VEJA São Paulo de 13 de janeiro de 2021, edição nº 2720

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