Nilta Murcelli segue como a principal peruqueira da cidade
Com cinquenta anos no ramo, suas peças custam entre 1 200 e 10 000 reais
Para muitas mulheres, cruzar as portas do salão de Nilta Murcelli, nos Jardins, não é um passo fácil. Boa parte de suas clientes aparece lá em busca de perucas após perder o cabelo em sessões de quimioterapia. Com cinco décadas no ramo, celebradas neste ano, a comandante do negócio soma experiência suficiente para fazer do processo algo menos sofrido.
A fim de atender esse público, ela abriu um espaço reservado, formado por quatro cabines privativas. “Trata-se de uma situação dolorosa, em que elas precisam raspar a cabeça”, diz. Depois dessa etapa, que costuma provocar lágrimas, o humor das clientes melhora quando elas se veem no espelho com o novo penteado.
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“Para mim, é gratificante ajudar as pessoas e ainda trabalhar com o que me dá prazer”, afirma Nilta, que vive recebendo cartões de agradecimento. “As peças têm um caimento excelente, bem natural”, relata a advogada Marlene Guímaro, que enfrentou um câncer de mama recentemente e comprou na loja duas peças loiras, uma comprida e outra curta.
Nascida em Minas Gerais, Nilta se mudou para São Paulo aos 17 anos. Já nutria admiração pela profissão de cabeleireira (quando criança, transformava as mechas de suas bonecas) e resolveu investir em um curso de especialização. Atendeu em casa até abrir seu próprio salão, na Vila Medeiros, na Zona Norte, em 1963. Nessa época, era moda exibir-se por aí com penteados sintéticos. Nilta não quis ficar de fora e produziu um modelo para uso próprio, porém feito com fios naturais. A clientela, que engordava a cada dia, gostou do resultado e fez encomendas.
Então Nilta passou a comercializar as perucas, que construíram sua fama e hoje custam entre 1.200 e 10 mil reais. Montou uma escola de profissionais de beleza no Belém, na Zona Leste e, em 1991, chegou ao ponto atual, na Rua Augusta. De início, ocupava os 300 metros quadrados nos fundos do estabelecimento. Agora, é dona de todo o prédio, de 2 mil metros quadrados, onde trabalham 48 funcionários.
Pela área privativa passam por dia cerca de dez mulheres e homens (que representam 10% do movimento). Parte das freguesas são judias ortodoxas, que, depois de casadas, usam uma cabeleira postiça, aprovada por rabinos, que só pode ser retirada na intimidade, diante do marido.
Aos 75 anos, Nilta comanda ainda sua própria manufatura, como itens costurados a máquina e a mão, que depois são lavados com desinfetante e água fervente. “No início, eu pegava meu Fusquinha e viajava pelo país em busca das melhores madeixas”, conta. Atualmente, ela as compra, em pacotes de 50 quilos, dos chamados “viajantes”, que rodam o Brasil, principalmente a Região Sul, para encontrar fios virgens, ou seja, que não tenham passado por processo químico.
Mas há ainda as pessoas que batem a sua porta oferecendo a cabeleira — nesse caso, recebem de 200 a 1.200 reais por pelo menos 40 centímetros de fios. Os mais valorizados são os compridos de cor clara. Com cerca de 120 modelos à venda, ela anda antenada com as tendências do momento. Oferece peças inspiradas nas mechas de Ana Maria Braga, Marilyn Monroe e da delegada Helô, papel de Giovanna Antonelli na novela Salve Jorge.
Elas duram um ano e devem ser higienizadas no salão mensalmente. O talento de Nilta fez com que ela fosse requisitada por famosos. Entre os nomes que investem em apliques e franjas falsas (a onda do momento) para teatro e cinema estão Regina Duarte, Xuxa e Luana Piovani. Hebe Camargo e Ana Maria Braga compraram lá suas perucas quando tiveram câncer.
Hoje em dia, Nilta fica mais na supervisão da empresa. Corta o cabelo das clientes antigas e dá palpites sobre os novos modelos. Sua filha Roseli e as netas Priscila e Patricia administram os negócios. “Enquanto Deus me der força, seguirei aqui”, diz ela, católica devota. “O próximo passo será exportar nossos produtos.”