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Suco de couve & ração humana

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 5 dez 2016, 18h45 - Publicado em 17 jun 2010, 12h53

Quando observo minhas imagens aos 20 anos, sinto ondas de fúria. Que tenebroso processo metabólico ocorreu para transformar aquele rapazinho magro em alguém com tanta vocação para engordar? Emagreci bastante há uns dois anos. Desde então, cometo loucuras para não engordar novamente. Alguns quilinhos ganhei, não nego. Se me distraio, os tais quilinhos se multiplicam espantosamente. Impossível perdê-los mesmo que eu percorra na esteira, diariamente, a distância do Oiapoque ao Chuí. Recentemente, um amigo inquiriu:

— Como faz para manter a forma?

— Simples. Eu me transformei em uma experiência química!

A palavra química não se refere somente aos inúmeros complementos que absorvo diariamente, de comprimidos de clorofila a própolis em drágeas. Mas às combinações alimentares nas quais mergulho, que estabelecem uma química dentro do organismo. Ultimamente eu me dedico ao suco de couve e à ração humana. A receita do suco é simples: bato duas folhas de couve no liquidificador. Engulo aquela coisa verde. E penso, como se fosse um castigo: “Quem mandou engordar? Agora sofra!”. Em seguida, tomo leite misturado com duas colheres de ração humana. Trata-se de uma mistura de cereais que, segundo se diz, oferece todos os compostos nutritivos necessários. Tem gosto de serragem. Está na moda. Todo dia conheço algum novo adepto da ração. Ou da couve. A mãe de um amigo garante ter perdido 20 quilos empanturrando-se com a dita cuja. Um primo resolveu todos os seus problemas intestinais com o suco. E por aí vai. Há quem diga que é delicioso. Sempre gosto de frisar:

— Se suco de couve fosse tão bom, seria oferecido em rodízio. E alguém troca uma picanha no espeto pela ração?

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Faço também o regime do tipo sanguíneo. Segundo a teoria, cada tipo de sangue exige ou rejeita certos alimentos. Sou O positivo. Poderia emagrecer a cada garfada se conseguisse decorar a tabela do que devo ou não comer. Meus neurônios fervilham quando ergo um cardápio na mão. Só lembro que polvo é proibido. Ah, vida, justamente polvo, que eu adoro! Abro uma exceção.

Os gordos ou propensos a acumular banhas têm uma vantagem sobre os magros.Na árdua batalha dos regimes, ganham mais condição de conhecer a alma humana. Adquirem sabedoria. Meu melhor amigo, capaz de dar a vida por mim ou de no mínimo emprestar uma grana sem

juros, não resiste a comentar quando me vê:

— O paletó está fechando?

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O mesmo que condena meus 4 quilos extras como um juiz em um tribunal, insiste em me oferecer um doce quando vou visitá-lo. Ou um vinho. Algo que, enfim, engorde.

— Ah, desculpe, não devo, estou de regime.

— Imagine, só hoje!

Ai de mim! Não é preciso insistir muito!

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Um outro amigo me trouxe ração humana feita no Pará por sua mãe, só com produtos da terra.

— É a melhor que existe, aqui em São Paulo você não encontra!

Para acompanhar o presente, uma caixinha de bombons.

— São de cupuaçu, você vai gostar…

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Agradeço com uma careta. Se quer me ajudar a emagrecer, por que os bombons? Ah, traidor!

Vou jantar fora com uma amiga. Digo não à sobremesa. Ela sorri, elogia minha força de vontade e escolhe meu doce predileto. Pisca, cúmplice:

— Garçom, traz duas colheres?

E lá vou eu!

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Para quem vive em regime perpétuo, não basta evitar frituras, massas e açúcar. Mas sim enfrentar um complô que visa a engordá-lo. E o pior: na primeira chance, todo mundo comentará cada centímetro na barriga! Em relação a regime, a Solidariedade é Zero!

 

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