Cracolândia paulistana é tema de documentário dirigido por Edu Felistoque
Filme é baseado em pesquisa sobre usuários de drogas no centro da capital, região que sofreu arrastão esta semana
Quando o cineasta Edu Felistoque decidiu se “infiltrar” na Cracolândia (após deixar a barba crescer para não chamar muita atenção), tinha esperança de entender por que o uso e tráfico de drogas a céu aberto no centro da cidade continuava sem solução. “Parece o problema da seca do Nordeste, que até hoje só fica na promessa”, compara. Cinco anos depois, ao lançar o documentário Cracolândia, acumula ainda mais dúvidas sobre o tema.
“Eu não entendia nada e ainda é difícil porque aquilo é um buraco negro mantido por várias frentes e lideranças. O problema é de saúde pública e acho esquisito os governantes deixarem tudo funcionar”, opina. “Foi criado um muro invisível como se ali existisse um campo de concentração.”
Exibido na Mostra Internacional de Cinema e selecionado para o Festival de Cinema Brasileiro em Paris, o filme ainda busca espaço para ser lançado pelas plataformas digitais em 2021. Com o arrastão a carros que ocorreu nesta terça (8) e aterrorizou motoristas no centro, o tema do longa-metragem voltou a ser amplamente discutido nas redes sociais.
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“Cheguei a visitar vários países, como Canadá e Estados Unidos, para conhecer casos parecidos, as craco ou cocaínalândias internacionais, mas nunca é a mesma experiência. E lá as pessoas são tratadas de fato como pessoas“, reflete Felistoque. Apesar de ter recebido críticas que apontavam o filme como “muito de esquerda” ou “muito de direita”, o diretor destaca que procurou ouvir todos os lados desse cenário: dos policiais aos usuários de drogas.
Após o primeiro ano de apuração e depoimentos gravados no próprio celular, o cineasta se uniu ao cientista político Heni Ozi Cukier, autor de pesquisa sobre soluções para a Cracolândia em São Paulo. No documentário, Cukier conduz entrevistas com ex-usuários de crack, psicólogos, agentes de saúde, assistentes sociais, juízes e membros de coletivos como A Craco Resiste.
“Eu só conseguia conversar com as pessoas quando estavam isoladas, senão formavam um ‘exército'”, conta o cineasta. “Para mim, foi uma cobertura de guerra, mas nessa guerra eu conseguia chegar de metrô.”