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Plano pós-quarentena vai de QR Code no cardápio a cinema no estacionamento

Com o início da flexibilização do isolamento social, comércios e serviços paulistanos já começam a fazer adaptações

Por Alessandra Balles, Arnaldo Lorençato, Fernanda Campos Almeida, Gabrielli Menezes, Guilherme Queiroz, Helena Galante, Juliene Moretti, Miguel Barbieri Jr., Pedro Carvalho, Saulo Yassuda, Sérgio Quintella, Tatiane de Assis, Tatiane Rosset.
Atualizado em 27 Maio 2024, 18h13 - Publicado em 29 Maio 2020, 06h00
Cúpulas de isolamento nas refeições: novas medidas (Christofe Gernigon Studio/Veja SP)
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A cidade de São Paulo começa sua lenta caminhada de volta à normalidade. As novas regras da quarentena no estado anunciadas na quarta-feira (27) preveem a reabertura parcial de alguns comércios e serviços do município a partir da segunda (1º), como shoppings centers, escritórios e lojas de rua. É, ainda, um ensaio. Eles devem operar em horários reduzidos e manter uma lotação máxima de 20%. A evolução para uma fase mais liberada (ou o retorno à restrição total) vai depender da taxa de contágio pelo coronavírus e da ocupação das UTIs. De qualquer maneira, uma série de empresas e autoridades públicas da capital já têm planos bem definidos para essa retomada. Destrinchar essas medidas, assim como pesquisar outras metrópoles do mundo onde o retorno está em marcha, é fundamental para entender como será a vida (e a economia) de São Paulo nos meses a seguir. Um periscópio para observar o futuro próximo.

Os projetos mostram, por exemplo, que shoppings e estádios de futebol tencionam transformar seu estacionamento em cinema drive-in. Revelam também que uma das principais empresas financeiras do país, agora adaptada ao home office, faz projetos para se mudar da cidade. E que há churrascaria que não vai mais servir as carnes em “espeto corrido” ao lado das mesas. Além de uma infinidade de outras adaptações que vão de parques a casamentos. “Será um recomeço difícil. A capital e seus negócios terão de se ajustar a um fluxo menor de pessoas”, afirma Cesar Caselani, da FGV. “Em São Paulo, a retomada será mais lenta do que em lugares que não sofreram tanto com a Covid-19, até pelo impacto psicológico da pandemia”, diz. Os detalhes em gastronomia você confere à seguir.

Rubaiyat reaberto

Não são, por enquanto, as duas unidades paulistanas da rede internacional de churrascarias que voltaram a funcionar. O retorno no dia 25, a última segunda-feira, foi da casa de Madri. Pelas leis espanholas, só podem operar nesta fase restaurantes com mesas ao ar livre como o Rubaiyat ,que possui um terraço. Entre as exigências, a ocupação se limita a catorze das 28 mesas disponíveis, mantendo-se uma distância de 2 metros entre elas. “Estamos com todos os lugares reservados nesta e na próxima semana”, surpreende-se o sócio Belarmino Iglesias, que cuida do negócio com a mulher, Ana Iglesias. Para evitar possibilidades de contágio, os clientes são recepcionados por uma hostess de máscara protegida por uma barreira de vidro. Sobre as mesas, há um QR code que permite baixar o cardápio no celular. Talheres e guardanapos chegam embalados a vácuo e as máquinas de pagamento são constantemente limpas. Há marcações no piso inclusive na entrada dos banheiros, para que se mantenha a distância entre os usuários — nesses ambientes, portas, torneiras e cestos de lixos são automatizados para que não se toquem neles. Os cuidados se estendem à brigada que entra em intervalos de dez minutos depois deter a temperatura medida. Ainda que as sola sdos sapatos sejam desinfetadas, os calçados são trocados logo na entrada, assim como as roupas por uniformes. “O que me surpreende é que os clientes não parecem preocupados. Só demonstram felicidade por poder sair de casa depois de mais de setenta dias de confinamento”, diz o empresário.

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Terraço do restaurante madrileno: garçons de máscaras, distância de 2 metros entre as mesas, marcações no corredor do banheiro e cardápio por QR code (Divulgação/Divulgação)

Menus mais enxutos

Esqueça cardápios com uma lista comprida de pratos e com uma profusão de ingredientes de nomes estrangeiros. Os menus devem ficar mais enxutos, para otimizar o uso dos produtos, e os itens nacionais estarão mais em evidência. “O custo da importação pode tornar a compra desses insumos quase impraticável. Além disso, deve haver diminuição na oferta”, acredita Lisandro Lauretti, da rede Jamie’s Italian. A unidade de Curitiba foi reaberta na terça (26), servindo apenas menu executivo e com 40% da capacidade original do salão.

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Um manual para o governo

Uma coalizão de chefs e empresários chamada de Frente Independente de Bares e Restaurantes de São Paulo, unidos à Associação Nacional de Restaurantes (ANR Brasil), enviou uma cartilha com sugestões para auxiliar o governo do estado a formular as regras para as reaberturas. Assinam o documento profissionais como Rodrigo Oliveira (Mocotó), Janaína Rueda (Bar da Dona Onça) e Ricardo Garrido (Cia Tradicional de Comércio). Entre as medidas, há o incentivo para que os clientes façam reservas e para que os pedidos sejam realizados por celular ou por uma ficha. “Acreditamos que é possível abrir com responsabilidade, conforto e sem a perda de nossa essência”, diz Cristiano Melles, presidente da ANR e sócio da rede Pobre Juan.

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Rodízio sem espeto corrido

Um ano e meio depois de vender a rede Fogo de Chão, Arri Coser voltou a investir no rodízio de carnes com o NB Steak. No menu criado, manteve para fatiar no espeto apenas a picanha e a fraldinha. Quando reabrir os restaurantes, sai de cena o jogo americano de couro para dar lugar a um de papel. “Nossos guardanapos também serão de papel — e biodegradável. Embora feitos de fibra de cana-de-açúcar, têm textura de tecido”, adianta. Entre os protocolos que vai adotar, há tapetes com cloro para desinfecção dos sapatos dos clientes logo na entrada.

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Degustação de carnes porcionadas: sobre jogos americanos de papel e guardanapos descartáveis (Mario Rodrigues/Veja SP)
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Longe do balcão

É possível que, mesmo com o retorno dos bares de coquetelaria, os balcões fiquem sem clientes por um tempo. Uma pena. É o melhor lugar para se estar, com o bartender, rei da hospitalidade. Os bebericos devem ser feitos em mesas no salão ou ao ar livre, o que pode causar problemas de ruído com a vizinhança e com a lei do Psiu. “Os endereços tendem a começar o expediente mais cedo, durante a tarde, com essa adaptação da área externa”, acredita Márcio Silva, do Guilhotina, que dispõe de varanda. Sócios de casas menores torcem por projetos que permitam que ruas sejam fechadas e ocupadas com mesas. “Pode ser que esses estabelecimentos sofram mais para buscar alternativas à limitação de ocupação”, diz Cristiano Melles, da ANR.

Espaço do Guilhotina: limitação de público
Espaço do Guilhotina: limitação de público (Divlgação/Veja SP)

Distância na cabeça

As coroas de papel do Burger King ganharam uma versão gigante na Alemanha. A ideia é reforçar a distância de 2 metros, indicada como medida de segurança mesmo após a reabertura das lojas do fast-food no país europeu. Outra forma criativa de demarcar esse espaço foi vista na cidade alemã de Schwerin, onde um restaurante chamado Cafe Rothe ofereceu aos clientes um divertido chapéu de macarrão de piscina. No Brasil, o Burger King ainda não definiu estratégias de comunicação para o “novo normal”.

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Cada um no seu quadrado

A Outback Steakhouse já está botando em prática o seu “novo normal”. Com pelo menos cinco unidades em operação no país por causa de decretos municipais ou estaduais que permitem o funcionamento, entre elas a de Campo Grande, a rede está adotando cuidados para manter o distanciamento físico. Um exemplo são as marcações no piso do salão para determinar que o atendente fique em posição segura em relação à mesa. Além disso, as áreas de espera foram abolidas e, na parte externa, foram colocadas indicações no chão para que os clientes fiquem a pelo menos 2 metros uns dos outros. Nos Estados Unidos, as casas da rede seguem medidas padronizadas como a desativação das bancadas do bar e o incentivo para que a freguesia aguarde por uma mesa no carro, já que por lá não há problemas de segurança.

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Unidade de Campo Grande: marcação no piso (Divulgação/Divulgação)

Com selo de segurança

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Parte dos restaurantes, cafés e docerias voltou a funcionar no dia 18 de maio em Portugal. Nesses endereços e também em hotéis e outros estabelecimentos do setor, o órgão Turismo de Portugal criou o selo Clean & Safe. Colados às portas demais de 8 000 estabelecimentos, mostram o compromisso com as medidas contra a disseminação da Covid-19.

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Limpo e seguro: selo criado pelo órgão Turismo de Portugal (Divulgação/Divulgação)

Doces na calçada

Embora tenham quatro lojas em shoppings, as sócias Daniela e Mariana Gorski, da Confeitaria Dama, acreditam que é na unidade de rua, em Pinheiros, que os clientes vão se sentir mais seguros. “Pensamos em tirar uma vaga de garagem para criar um de que ao arlivre”, diz Mariana. Outra novidade é o lançamento do Dama Empório, um empório virtual que levará aos clientes parte dos preparos da marca, como éclair sem recheio e pão de ló. A ideia é que as pessoas complementem as pedidas com o que tiverem em casa.

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Vitrines no Ráscal

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Os caprichados bufês da rede Ráscal não vão acabar. Mas já estão adaptados aos novos tempos, como você confere aqui em primeira mão. Em vez de expostos para os clientes, saladas e antepastos estarão protegidos por vitrines. Bastará indicar a um atendente, sempre de máscara e luvas, a quantidade desejada no prato. O novo método é o mesmo utilizado na ilha de massas e carnes do restaurante. Será abolido por completo o self-service. “Temos hoje um comitê de segurança, que acompanha todos os passos para garantir as boas práticas, assim como instruir e conscientizar as pessoas que trabalham conosco. Neste momento, como os restaurantes estão fechados, há uma dedicação exclusiva aos profissionais que estão trabalhando no delivery e no Ráscal Encomendas”, explica Luisa Bielawski, diretora de marketing do Grupo Ráscal. “Para se ter uma ideia, temos quatro tipos de máscara para nossos funcionários, uma delas especial para aqueles que trabalham na área quente.”

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Saladas e antepastos: proteção envidraçada e fim do self-service (Divulgação/Divulgação)

Paquera sem aglomeração

Com jeito de boteco, o Vaca Véia, no Itaim Bibi, construiu sua fama com a paquera na calçada. A galera bebericava e usava de apoio inusitadas tábuas de passar, que serão aposentadas. “Teremos mesas para evitar aglomeração e marcações no chão”, afirma o sócio Fabio Prado.“Estudamos a possibilidade de ter um pulverizador (de desinfecção) também.” Outro bar do grupo, o premiado Periquita & Gin Club vai tirar de cena, por ora, a pistinha de dança, que se transformará em salão. “O maior desafio é conquistara confiança dos clientes.”

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Pôster da iniciativa
Pandaid, que combina humor com design gráfico para incentivar o distanciamento social: um atum de separação entre as pessoas (Eisuke Tachikawa/Divulgação)

Compras com barreiras

As redes Pão de Açúcar, Extra, Carrefour e St Marche e o Empório Santa Maria instalaram painéis de acrílico nos caixas para protege rfuncionários e clientes. A barreira deve se manter para além da pandemia, assim como a higienização constante de carrinhos e o fornecimento de álcool em gel. As compras via aplicativos de entrega ou por um sistema de drive-thru, no caso do St Marche, também se mostram fortes alternativas no “novo normal”.

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Loja da rede Carrefour: divisória de acrílico nos caixas (Divulgação/Divulgação)

La Casserole com calçadão

Um dos restaurantes franceses mais tradicionais da cidade, o La Casserole passou por um mês de transtornos no início deste ano com as reformas realizadas no charmoso Largo do Arouche. Para piorar as coisas, estão sem funcionar desde 20 de março, com a decretação do isolamento social. Mas um saldo positivo vai ficar com a remodelação do espaço público. O bistrô, que acaba de completar 66 anos, ganhou um calçadão, no qual os proprietários sonham em espraiar mesas que darão direto para o colorido Mercado das Flores, do outro lado da rua.

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Vista privilegiada: reabertura com mesas na calçada de frente para o Mercado das Flores no Largo do Arouche (Divulgação/Divulgação)

Para pegar e levar

“Mesmo com a flexibilização, os clientes vão continuar consumindo café em casa em vez de frequentar cafeterias com a intensidade de antes”, acredita Boram Um, sócio da rede Um Coffee Co. O plano para se adaptar à nova realidade é reformular a assinatura de grãos e equipar as lojas de forma a reforçar o serviço de take out. Atualmente, a entrega da bebida pronta para o consumo é realizada somente pela unidade de Pinheiros.

Menos balada, mais boteco

O Trabuca, bar-balada que ao longo da noite virava uma festa aglomeradamente boa, ficará comportado. “Vamos operar com formato de boteco na reabertura”, revela o sócio Denis Endo Nicolini. E, primeiramente, só a unidade dos Jardins,a mais arejada. O público fará os pedidos sentado, com a ajuda de QR code,em vez de solicitar no balcão, e terá anteparos transparentes isolando as mesas.O número de clientes cairá de 270 para 90. O Trabuca está ainda providenciando medidores de temperatura e máscaras de proteção para o staff. “A peça terá estampa de beijo ou sorriso. Você está indo a um bar, não a um hospital”, diz Nicolini. Liberar o salão para o público circular ao som do DJ? Só mais para a frente. “Acompanho casas noturnas de Hong Kong que estão voltando. Isso nos anima.”

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Salão do Trabuca: no futuro, nada de gente (Flashbang/Veja SP)

Proteção arquitetada

O desafio de sentar-se à mesa de um restaurante com segurança motivou o designer francês Christophe Gernigon na criação do chamado Plex’Eat. Trata-se de uma ampla e bizarra cúpula de acrílico suspensa que cobre a cabeça e parte do tronco de cada cliente, evitando o contato direto com o garçom e com quem a refeição é partilhada. Cada unidade custa cerca de 150 euros. Ou seja, para uma mesa de três lugares, paga-se o equivalente a 2 650 reais. Um esquema diferente é testado no restaurante Eten, no centro cultural Mediamatic Biotoop, em Amsterdã. Cinco mesas foram dispostas na área externa, cada uma dentro de uma estufa de vidro para que os consumidores fiquem isolados. Há ainda dois cuidados extras: a brigada serve os pratos através de uma porta e só moradores de uma mesma casa podem dividir a graciosa estrutura.

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Estufa de vidro em Amsterdã: distância entre o cliente e o garçom (Paco Nunez/Anadolu Agency/Getty Images)

Noma pop

Restaurante que já foi considerado o número 1do mundo pelo ranking 50 Best, da revista inglesa Restaurant, o dinamarquês Noma reabriu na pós-quarentena com uma proposta bem simples. Oferece só hambúrgueres e vinhos no menu. Aqui em São Paulo, o chef Erick Jacquin acredita que talvez seu restaurante recém-inaugurado, o Président, regresse mais pop. “Na volta, não sei se poderei fazer a comida clássica com toques modernos e ingredientes como foie gras e caviar. Neste momento, há delivery com pratos mais em conta, como jarret de cordeiro com ragu de lentilha.”

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Publicado em VEJA SÃO PAULO de 3 de junho de 2020, edição nº 2689.

 

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