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“É um jeito de tê-la perto de mim, como se ainda estivesse aqui”

Após a morte da esposa, Saulo Ramos Biriba encontrou uma forma de tê-la consigo em todos os lugares: derreter as duas alianças para fazer uma só

Por Saulo Ramos Biriba, em depoimento a Mattheus Goto
Atualizado em 27 Maio 2024, 21h26 - Publicado em 14 out 2022, 06h00
Foto de Saulo Ramos Biriba e Bruna Meira Biriba, sorrindo para a câmera
Quinze anos de história: eles se casaram em 2010, após três anos de namoro, e viviam grudados (Arquivo pessoal/Veja SP)
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“No começo, nós nos estranhamos. Ela era amiga do meu irmão. Éramos adolescentes, na época do MSN, por volta de 2005. Tinha uma quermesse rolando aqui perto de casa e decidi chamar a Bruna para tomar um refrigerante. Ela respondeu: ‘Não, vai tomar no c…’, e não falou mais nada. Fiquei pensando: ‘Que menina grossa’. Um dia, meu irmão levou-a em casa e pensei em fazer minha vingança. Na hora que veio me cumprimentar, desviei. Continuamos nos odiando por um tempo.

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Alguns meses depois, a raiva passou. Eu trabalhava em uma loja de instrumentos musicais em um shopping em Guarulhos, e ela em uma loja de roupas. Uma vez, eu estava almoçando e a Bruna veio e perguntou se podia comer comigo. A gente começou a conversar e sentiu que tinha uma identificação. Passamos a almoçar e a ir embora juntos todos os dias.

Acabou que começamos a ficar. Ela pediu um tempo, para ter certeza de que era isso mesmo, pois não queria perder a liberdade. A Bruna era meio rebelde. Mas a gente se apaixonou e começou a namorar. Depois, percebi que ela se escondia por trás dessa casca da rebeldia e não era assim de verdade. Era muito brincalhona. Me tirava altas risadas, sem nem precisar contar piada. Era um pouco estabanada. Às vezes batia em alguma coisa ou derrubava e fazia uma cara muito engraçada.

No fim de 2009, já tinha certeza de que era a pessoa com quem eu queria passar o resto da minha vida. Não sei explicar, simplesmente sabia. Comprei uma aliança, coloquei-a em uma caixinha. Tinha pensado em preparar um jantar romântico para fazer o pedido, mas estava ansioso e a pedi em casamento na casa da mãe dela mesmo. Ela ficou muito feliz, saiu correndo, acordou a mãe, pulou em cima da cama, fez um fuzuê. Falou ‘sim’ e ficamos noivos.

Nosso casamento foi no dia 16 de janeiro de 2010. Passou um tempo, descobrimos que ela estava grávida. Engravidou na lua de mel. Nossa filha nasceu em setembro do mesmo ano.

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Decidimos que a Bruna ficaria em casa cuidando da nossa filha e eu faria faculdade. Me formei em direito. Ela queria fazer medicina veterinária. Era uma pessoa muito generosa, adorava bichos. Vivia brincando e alimentando os cães da rua. Mesmo que estivesse arrumada
para sair, sempre pegava-os no colo.

De lá até o ano passado, foi tudo tranquilo. A gente brigava uma vez ou outra, mas era coisa boba. Mesmo que fosse sério, não durava horas. logo já estávamos assistindo a um filme juntos de novo.

A Bruna tinha depressão. Eu também tinha e fazia tratamento, ela não. No começo do ano passado, percebi que a doença dela estava piorando. Dei um jeito de incluí-la no convênio e ela começou a melhorar, a passos de tartaruga.

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Sabia que se minha esposa continuasse em São Paulo, seria pior. Conversei com meus sogros para ela passar um tempo na casa deles, em Avaré, no interior. Foi o lugar onde cresceu. Ela foi e, a cada quinze dias, eu ia para lá. Às vezes passava um mês, já que estava trabalhando de casa. E continuamos fazendo chamadas de vídeo a distância. Mas sentia que algo na essência dela havia mudado. Não sei o quê.

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Em setembro, minha esposa veio para cá, para o aniversário da nossa filha. Fizemos festa com bolo. Depois, ela retornou para Avaré, dizendo que queria voltar a morar aqui em São Paulo.

No dia 4 de outubro de 2021, fizemos uma ligação por vídeo. Ela não estava com um humor muito bom, não falou muita coisa. Depois das 11 horas, ela parou de responder. Às 14, a mãe dela me ligou e deu a notícia do suicídio.

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Meu mundo caiu. Foi o pior dia da minha vida. Fiquei sem rumo. Era como se tivesse perdido um pedaço. É surreal você encontrar o amor da sua vida e depois perdê-lo. Uma dor muito grande. Um era o apoio do outro. Tudo o que eu fazia com ela, agora faço sozinho. Tínhamos vários planos. Ela fez a prova e foi aprovada em medicina veterinária e ia começar a estudar em 2022.

A aliança dela ficou comigo. Se eu fosse guardar como lembrança, seria um gatilho. Ela sempre me pedia um anel feito pela artesã Bárbara Maciel. Depois que tudo aconteceu, entrei em contato com a Bárbara e contei nossa história. Deixei nas mãos dela para interpretar nosso amor na joia. Comovida, ela fez, como presente para Bruna, a ‘joia celestial’, com uma pedra da antiga aliança. É um jeito de tê-la perto de mim, como se ainda estivesse aqui.”

Foto de aliança sobre apoio de madeira
Joia celestial: com inspiração no céu, nas
estrelas e nos astros, artesã derreteu dois anéis para fazer um só e utilizou uma pedra da antiga aliança (Bárbara Maciel/Divulgação)

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