LGBTs na ditadura: mostra fala sobre perseguição à diversidade no período
Exposição gratuita conta com fotos da década de 70 que retratam boates da região central e protestos contra ações policiais da época
No Memorial da Resistência, na Luz, a exposição Orgulho e Resistências: LGBT na Ditadura trata de um assunto ainda pouco abordado sobre o regime autoritário. Em cartaz desde 15 de outubro, a mostra gratuita explora a perseguição a LGBTs na cidade de São Paulo em um contexto de “higienização moral”.
Por lá o público pode encontrar fotografias, vídeos, documentos e jornais que retratam as operações policiais que eram realizadas na região central da cidade nos anos 1970. Não faltam também documentos sobre o surgimento de um movimento social organizado contra essa perseguição e registros de baladas na região central conhecidas por abrigarem aquele público. Os ingressos precisam ser reservados com antecedência pelo site (veja link ao final).
“Eu fiz minha tese de doutorado sobre esse tema, as políticas sexuais da ditadura brasileira. Tentando entender como a ditadura tinha uma série de ações para a sexualidade”, explica o curador Renan Quinalha. Para além da exposição, seu doutorado em Relações Internacionais deve sair no ano que vem como um livro pela Companhia das Letras, com o título Contra a moral e os bons costumes: as políticas sexuais da ditadura brasileira.
Na pesquisa, Renan fala sobre a sociabilidade LGBT na capital paulista entre os anos 1970 e 1980, que tinha lugares definidos na região central, separados por classe social.
Havia a Boca de Lixo, na região do Largo do Arouche e a Luz, “com botecos, as pessoas ficavam bebendo na porta”, diz. “Tinham lugares de pegação. Era todo aquele pedaço, as praças. Não tinha um endereço em específico, um bar que era LGBT”.
E a Boca de Luxo, na região da Rua Augusta e a Praça Roosevelt, com boates como a Medieval e a Homo Sapiens. “Tinha uma divisão. Os lugares que eram mais protegidos eram na Boca de Luxo, de pessoas com mais condição financeira, menos atacados pela polícia. E a Boca de Lixo, que não tinha essa proteção, com uma população LGBT mais pobre, que ficava em bares e lugares públicos, mais exposta”, diz Renan.
“As operações policiais envolviam uma grande quantidade de camburões, delegados. E existem vários registros nos jornais com o secretário de segurança na época, o Erasmo Dias e o governador, Paulo Maluf, dizendo que essas operações iam continuar”, conta.
Outro ponto importante da mostra é o surgimento do grupo Somos, de 1978. “Antes desse grupo, as pessoas se encontravam em clubes de leitura, faziam pequenas publicações. Organizavam festas, concursos de miss gay e miss travesti. Mas ele se torna um marco porque leva a construção de uma identidade e surge uma consciência política”, explica. 1979 é o primeiro ano em que o Somos vai para a rua na capital paulista, pedindo o fim da violência e das operações contra os LGBTs.
“Um momento icônico é um ato no Teatro Municipal, em 13 de junho de 1980, depois de uma operação violenta no centro. Eles não tinham uma sede fixa no início. Faziam reuniões em apartamentos na região da República, sempre mudando de lugar para não chamar a atenção das autoridades. Consideramos o grupo como o marco do início do movimento LGBT organizado no Brasil”.
A mostra conta também com fotografias de Vânia Toledo, que retratou as boates da época e um desenho da cartunista Laerte, feito especialmente para a exposição. É bom levar o seu fone de ouvido para aproveitar os materiais em vídeo. Fica em cartaz até 26 de abril de 2021.
Memorial da Resistência. Largo General Osório, 66, centro. Ingressos aqui.