Livrarias apostam em unidades menores para competir com o on-line
Livraria da Vila vai abrir cinco unidades na capital paulista até julho
Na mesma velocidade em que antigas redes de livrarias perdem força na capital, marcas menores conquistam cada vez mais espaço — na pandemia, alguns livreiros juram viver melhor que muitos comércios. “As pessoas não deixaram de ler”, crava Martine Birnbaum, supervisora da Livraria da Travessa em São Paulo. Com o fechamento de uma hamburgueria ao lado da loja na Rua Pinheiros, a filial decidiu investir em uma ampliação, inaugurada neste mês. “A sequência de livros expostos nas prateleiras também conta uma história, e agora que dobramos de tamanho pudemos ampliar esses títulos.”
Embora alguns leitores ainda lamentem o fim da Fnac (que encerrou as atividades no país em 2018) e o fechamento de várias unidades da Saraiva e da Cultura (atualmente em recuperação judicial), a extinção das megastores é vista como uma tendência mundial. “Além de serem mais aconchegantes, as lojas físicas menores investem no atendimento personalizado”, observa Gerson Ramos, diretor comercial da Editora Planeta e profissional do setor há 39 anos. “Nas grandes redes, a rotatividade da equipe impede que o vendedor crie aquele vínculo afetivo com os livros, tão necessário nos pedidos de indicações dos clientes.”
Mesmo com a metade do tamanho, a Livraria Francesa ganhou novos ares ao se mudar para Moema após 73 anos no centro. “Acabamos nos aproximando muito mais da clientela”, observa a proprietária, Silvia Monteil. “A loja agora é de rua, fica em uma casa e as pessoas nos redescobriram nos últimos meses.”
“A livraria ainda é o lugar onde as pessoas descobrem os lançamentos”
Aos poucos, redes como a Livraria da Vila e a mineira Livraria Leitura têm substituído o vazio deixado pelas megalojas em alguns shopping centers. Até o fim do ano, a Vila planeja abrir cinco unidades na capital, entre elas uma na Zona Leste (Shopping Anália Franco), a primeira na Zona Norte (Center Norte) e uma no Pátio Paulista. Com treze em funcionamento atualmente, serão dezesseis lojas até o fim do ano.
“Nos dois períodos de fechamento da pandemia vivemos uma situação de guerra e vimos o faturamento ir a zero”, relembra Samuel Seibel, presidente da marca. “Enquanto os e-commerces e as mídias sociais ajudavam um pouco nas vendas, parecia loucura manter o plano de expansão, algo que foi pensado lá em 2018, mas acreditei que ao longo de 2021 e 2022 estaríamos próximos da normalidade.”
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No caso da Livraria Leitura, estão previstas duas novas unidades, uma no Shopping Interlagos e outra no Jardim Sul. “Com o fechamento das grandes redes, sobrou espaço e acabamos entrando com tudo em São Paulo e no Rio”, resume o presidente Marcus Teles. “Tivemos queda nas vendas com a pandemia, mas as compras no site multiplicaram. Nossa maior concorrente hoje é a internet.”
Sem poder bater de frente com os preços de gigantes como a Amazon, as principais redes depositam suas esperanças nos frequentadores que ainda preferem buscar novos títulos presencialmente. “E a livraria é o lugar onde as pessoas descobrem o que está sendo lançado. Os lançamentos mais comerciais venderam mal nesses tempos porque precisam muito dessa vitrine”, acredita Alexandre Martins Fontes, da Martins Fontes Paulista. “Quando as vendas migraram para o on-line, as pessoas passaram a comprar mais o fundo de catálogo, os clássicos que nem sempre são bem expostos nas livrarias físicas. Quem nem tinha site certamente sofreu muito no último ano, como o restaurante que não tinha o serviço de delivery.”
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O prazer de poder folhear os livros ao vivo e a proposta de um catálogo mais enxuto são o foco de várias livrarias de bairro, que fazem sucesso ao anunciar obras de um gênero ou recorte específicos — caso da Gato sem Rabo, na Vila Buarque, que trabalha apenas com obras escritas por mulheres, e a Megafauna, no Copan, dedicada à curadoria de profissionais do mercado editorial.
Fernanda Diamant, que coordena a Megafauna, também acaba de abrir a Editora Fósforo, com uma seleção de obras de não ficção e literatura. “Já tivemos uma resposta muito boa, mas a editora foi pensada para dar certo a longo prazo”, explica. “Nosso mercado não funciona como os outros produtos, necessita calma.”
Para Martins Fontes, a sobrevivência de livrarias físicas depende de um maior equilíbrio com os e-commerces. “Uma lei que regulamente os descontos abusivos dos sites, como existe na Alemanha, na Argentina e em Portugal, protegeria quem vive só da venda de livros”, defende. “Uma das nossas lutas como sociedade é fazer com que as livrarias não desapareçam.”
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Publicado em VEJA São Paulo de 23 de junho de 2021, edição nº 2743