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“Essa turnê é diferente de todas que o Chico já fez”, diz Mônica Salmaso

Convidada de honra da turnê 'Que Tal um Samba?', de Chico Buarque, a cantora paulistana compartilha sensações, medos e bastidores do projeto

Por Tomás Novaes
Atualizado em 28 Maio 2024, 09h05 - Publicado em 24 fev 2023, 06h00
Imagem mostra mulher sorrindo, usando batom vermelho da mesma cor do fundo
Salmaso, 51: na estrada com Chico Buarque. (Lorena Dini/Divulgação)
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Quem foi rápido e conseguiu ingresso para um dos dezesseis shows esgotados que Chico Buarque fará em São Paulo entre março e abril deparará, no abrir das cortinas, com Mônica Salmaso, 51, iluminada, no centro do palco.

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Responsável pelo primeiro ato das apresentações, ela entoa seis canções acompanhada da banda e de seu kalimba — pequenino instrumento melódico tocado com os dedos. “Eu brincava que iriam jogar amendoim em mim se demorasse para o Chico entrar”, conta a paulistana.

Nascida no Jardim Paulista e formada no colégio Equipe, iniciou a carreira nos anos 90 e se tornou uma das vozes brasileiras mais prestigiadas dos últimos tempos.

Já havia colaborado com Buarque no disco Carioca (2006) do bamba, mas foi com um vídeo na pandemia que a relação se estreitou.

Sobre essa e outras histórias, confira o papo a seguir.

Você foi capa de VEJA SÃO PAULO em 2020, com seu projeto de vídeos na pandemia. Hoje, mais de um ano após a retomada da vida presencial, qual o balanço que você faz dessa volta?

Foi muito intenso o que a gente passou, especialmente no Brasil, que foi uma pororoca de desgraças. Foi uma trombada, um deslocamento muito violento. E isso causou muitas mudanças. A primeira, enorme, uma revisão geral da vida, do que é mesmo necessário. A gente não sobreviveria sem as artes. Mesmo que esse contato tenha sido pelas redes sociais — eu só encontrei um lugar para mim nas redes dentro da pandemia, quando essa era a única maneira. Isso foi revolucionário para mim. Outra coisa é que, com o tipo de carreira que eu tenho, a gente sempre está envolvida com o “leão” da vez, o projeto do momento. E eu nunca tinha parado para olhar para trás, porque eu nunca tinha parado desde que comecei a cantar. Essa paralisação obrigatória e a quantidade de pessoas que toparam fazer os vídeos do Ô de Casas comigo — no total foram 175, com gente repetida — me deram uma medida que eu nunca tinha tido do meu tempo de estrada.

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Após passar o isolamento em Sarapuí (SP), sua relação com São Paulo mudou?

Eu imaginava, como muitos paulistanos, que eu não iria me acostumar ao interior. E me acostumei muito bem até. Confesso que até demorei para me reacostumar aqui — falava “Nossa, quanto barulho”, “Nossa, como essa água da gente tem cheiro de remédio”, esses negócios de roça (risos). Mas, semana passada, fui ao cinema — eu nunca mais tinha ido. Também fui assistir à peça da Ana Beatriz Nogueira. Queria dar flores para ela e tinha uma floricultura superlegal no Copan. Fui também a um restaurante de amigos. Essa é a parte que mais gosto de São Paulo. Eu estava saindo de casa só para trabalhar, por causa da responsabilidade dessa quantidade de shows muito grande com o Chico. Não queria ser a razão de cancelar, adiar ou atrapalhar e terem que me substituir. Então eu estou muito comportada, mas comecei a rever a beleza daqui.

Não por acaso, um dos seus vídeos mais famosos do projeto Ô de Casas é com o Chico, cantando a música que hoje encerra os shows: João e Maria. A sua aproximação com ele aconteceu ali?

Fazendo os vídeos, vira e mexe a gente gravava uma música dele. E, assim como fazia com outros compositores, eu mandava o link por e-mail, querendo dar um presente. E brincava: “Saiu um pão quentinho aqui hoje”. Era linda essa rede. Depois de algumas tentativas de convidá-lo, dei uma última ideia: fazermos João e Maria no arranjo em que ele está acostumado, no mesmo tom, cantando o pedaço que ele quisesse. Ele topou. É óbvio, quando foi ao ar, aconteceu tudo elevado à potência Chico. Chico é uma potência. As pessoas piraram, se emocionaram. Acho que isso estreitou a nossa relação. Ele criou ali uma pequena relação de confiança, somada a uma relação de identidade artística, de reconhecimento de que o que eu faço tem a ver com o que ele faz, e virou esse convite.

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E quando foi feito o convite para a turnê?

Foi no fim de 2020 ou começo de 2021. Esse assunto apareceu diante de uma oportunidade de um show de cinquenta anos do disco Construção — que tem a minha idade, nasci em 1971 também. Ele perguntou se eu toparia fazer com ele, eu disse que lógico que sim. Aí veio uma nova onda da Covid e esse ano se perdeu. Mas ele falou que ainda não tinha desistido da ideia e que o convite seguia. Eu disse para ele ficar muito à vontade, para ele não sentir que me devia alguma coisa. O presente ele já tinha me dado, só de ter pensado nisso. Um tempo depois, ele disse que queria mesmo fazer, então a gente começou a levantar possibilidades e foi se desenhando essa turnê.

Você acabou de fazer dezoito shows lotados no Rio de Janeiro. Como está sendo esse momento?

É uma honra absurda, pelo tamanho e pela improbabilidade. Já brinquei mil vezes: nem alucinando muito eu poderia supor um troço desse. Nem em sonho. Tem duas coisas engraçadas nessa história. A primeira é que, do mesmo jeito que fazer um show com o Chico dá um nervoso e é muita responsabilidade, tem um outro lado que é estranhamente familiar. Tem a ver com o fato de que eu cresci ouvindo Chico. A obra dele é maior do que a minha formação musical, faz parte da minha formação emocional. É estranho, é como se você convivesse com uma pessoa ultradistante e ao mesmo tempo familiar, sabe?

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Qual é a importância dessa turnê?

Eu tenho certeza que essa turnê é diferente de todas que o Chico já fez. Pelo momento, pós-pandemia e com a eleição. Começou antes das eleições, aconteceu durante os dois turnos e continua depois. Não tem como desvincular. Estreamos a turnê e, para muitas pessoas, era o primeiro show a que elas assistiam depois da pandemia. Todas as noites tinham uma carga de alívio, de alegria, de esperança, que era por si só um negócio de deixar a emoção à flor da pele. Esse show revisita muitas fases do Chico e fala sobre tudo. Não é um showmício, nunca foi um show que entrou de sola, com o pé na porta da situação que estávamos vivendo. Mas, ao mesmo tempo, é altamente político, denso e forte. Eu acho que a potência mais linda do show é devolver a nossa casa para essas pessoas que estão ali. Não sei como resumir um troço desses. É um convite que em qualquer momento da minha vida seria absolutamente inacreditável, agora nesse momento do Brasil ficou mais ainda.

E qual o momento mais especial do show?

Difícil. É tudo muito lindo e muito forte. E a resposta do público é muito grande. Eu confesso a você que eu temia a minha participação. O primeiro bloco é o meu solo. Eu temia que as pessoas ficassem inquietas para a chegada do Chico, claro. Mas não aconteceu — pelo menos até aqui (risos). Foi superbonito. E, toda vez que termina uma temporada, eu sempre agradeço, porque para mim outro presente, além de estar ali, é a plateia me receber com generosidade e embarcar comigo nisso.

Publicado em VEJA São Paulo de 29 de fevereiro de 2023, edição nº 2830

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