Quando a poesia é grito de liberdade
Aos 84 anos, Lúcia Cortez Mendonça lança seu segundo livro de poesia, em que revisita as dores e as delícias de envelhecer
Ela classifica sua poesia como espontânea. E que só tomou gosto por colocar os sentimentos em palavras depois de passar por um processo analítico, aos 50 e poucos anos, que a fez se sentir mais livre. “A análise rompeu com coisas arcaicas e me trouxe a liberdade. Disso, saiu poesia”, relembra Lúcia Cortez Mendonça, 84, psicoterapeuta de linha psicanalítica, que no próximo dia 10 lança seu segundo livro de poesias, A Velha e o Mar (Editora Cajuína, 118 págs., R$ 60,00), na Livraria da Vila da Vila Madalena, a partir das 18h. A publicação tem ilustrações de Adriana Ferla.
Na obra autobiográfica, Lúcia fala sobre amor, amizades, luto e envelhecimento. Com linguagem poética, narra acontecimentos cotidianos saídos da memória e ressignificados pelo tempo. E ele, o tempo, também é assunto, aliás, como não poderia deixar de ser. “Um instante, e zass… / Aconteceu! / Uma palavra bem dita, / Um olhar cristalino e revelador, / E com sorriso lá vou eu, / Mergulhando cheia de amor / Na Vida”, diz o trecho do poema Instante.
Mas e o mar que está no título e remete à obra de Ernest Hemingway (O Velho e o Mar)? Ele também vira palavra fluida pelas páginas do livro — mais precisamente o mar da Bahia, terra que Lúcia conheceu ainda jovem e escolheu como destino para este momento de vida. Hoje, é na Ilha de Itaparica que a escritora vive a maior parte do tempo — entre amigos e a vizinhança que a acolheu.
Mas, diferente do pescador Santiago, personagem de Hemingway, que temia pelo futuro, os olhos dessa narradora estão voltados para o presente. “Viver é para profissionais. Envelhecer é não deixar que nada nos sequestre da vida”, afirma Lúcia, que diz ter sempre buscado uma maneira de se expressar com máxima liberdade.
Muitos anos antes, quando estudava no tradicional colégio Des Oiseaux, em São Paulo, Lúcia decidiu cursar aulas de teatro, ela é irmã do ator Raul Cortez, para perder a timidez e, quem sabe, descobrir uma vocação. Mas bastou uma apresentação — que atraiu toda a família para a plateia — para ela entender que aquela não era sua praia.
Seu barato sempre foi a palavra escrita, que virou ferramenta para manifestar afeto — por si mesma e pelos outros. E, entre esses outros, está Joaquim, a quem Lúcia dedicou seu primeiro livro, comoVida (2000). O companheiro de vida por 24 anos morreu em 2001, em decorrência de um câncer. O luto e a saudade foram transmutados em poesia. “O meu amor / Está naquela / Maré cheia / Acariciando Ávida areia. / Está no pôr do sol / Vermelho-Amarelo / Que de longe se enternece / De tanto te olhar. / Arde amores!”, diz um trecho de Meu Amor.





