Cidade Matarazzo: complexo em expansão apresenta centenas de obras de arte
Com inaugurações até o fim de 2025, local que abriga Hotel Rosewood, Casa Bradesco e Soho House se transforma em polo cultural e gastronômico
A 200 metros da Avenida Paulista, a Cidade Matarazzo não para de crescer. Após passar quase trinta anos abandonado, o espaço que abrigou o Hospital Umberto I ganhou novo propósito como megacomplexo de luxo e hoje acomoda três empreendimentos de sucesso: o Rosewood São Paulo, seis-estrelas recém-premiado como melhor hotel da América do Sul pelo ranking The World’s 50 Best Hotels; o clube londrino Soho House, inaugurado em junho; e a Casa Bradesco, aberta em setembro com uma mostra inédita do indo-britânico Anish Kapoor e espaços inéditos previstos para os próximos meses.
Novas obras e reformas já transbordam pelas ruas Rio Claro e São Carlos do Pinhal com o projeto Sua Rua, feito em parceria com a prefeitura e custeado por empresas privadas. Até o fim de 2025, o trecho terá uma calçada de mosaico de ladrilhos e a chamada Alameda das Flores, bulevar para pedestres que liga a Cidade Matarazzo à Paulista e desemboca em frente à estação Trianon-Masp e à Fiesp.
Ali serão instalados onze minirrestaurantes de rua com design assinado pelo Estúdio Campana. “Estamos regenerando o entorno”, diz a coordenadora Alexandra Forbes. “Teremos comidinhas de alguns dos mais famosos chefs do Brasil, representando diferentes culinárias regionais.”
Aberto ao público, o bulevar terá wi-fi gratuito e programação de exposições, palestras e oficinas.
Do topo da Torre Mata Atlântica, na suíte tríplex do Rosewood (com diárias de 50 000 dólares), Alexandre Allard vê seu sonho se concretizar. O empresário não se cansa de citar a riqueza cultural brasileira como alicerce do projeto, idealizado por ele desde 2007, quando descobriu o terreno.
“Minha visão era a de um Brasil que acreditasse cada vez mais na sua criatividade, gastronomia, design, moda e arte”, resume. “E só se tem uma chance de causar uma boa primeira impressão”, completa, ao citar um ditado francês.
Desde então, o endereço tem atraído cada vez mais frequentadores como polo de hospedagem (incluindo a Soho House, que também contempla 32 quartos de hotel, 26 em operação) e como centro gastronômico, com os três restaurantes e dois bares do Rosewood — durante uma das visitas da reportagem, o Le Jardin, situado no centro do prédio, seguia lotado de clientes em plena segunda-feira.
Tudo isso é adornado por centenas de obras de arte. Do tapete de Regina Silveira no hall de entrada às paredes de aquarela feitas a mão por Virgílio Neto, essas criações integram um “tour das artes”, passeio guiado pelos corredores do seis-estrelas, que reforça o protagonismo de expressões artísticas brasileiras por todo o complexo. Confira abaixo alguns dos destaques de cada local.
Centenas de estrelas
Mais de 450 obras de arte compõem a decoração do Rosewood. Algumas se camuflam pelos ambientes, como o desenho de uma cobra que circunda todo o estacionamento ou os azulejos geométricos na cozinha do restaurante Blaise (leia mais no fim da matéria), que homenageiam o passado do edifício, onde funcionou uma maternidade, e ainda escondem um easter egg, uma surpresa visual (confira na galeria abaixo).
“Quando nos aproximamos, notamos que são mulheres em posição de parto. E, a cada 37 azulejos, o artista representa uma mulher transexual”, conta Vinicius Romancini, supervisor da equipe do Art Library. Outras composições são menos discretas e roubam a cena, caso da piscina de ladrilhos executada pela designer francesa Delphine Araxi; a grande escultura Brazil Emerald Lupine, ao lado da Capela Santa Luzia; e o teto do bar Rabo di Galo, assinado pelo artista plástico Cabelo.
Parte desse acervo está à venda no hotel, como a Olho Mater, de Denise Milan (por 320 000 reais). Para quem deseja apenas contemplar e descobrir as histórias por trás desse circuito, o hotel promove uma visita guiada para hóspedes e não hóspedes, com grupos de até quatro pessoas (por 1 100 e 2 200 reais, respectivamente).
Cena local nos corredores
Além da programação de festas e eventos que acontecem toda semana na Soho House, a coleção artística é outro componente importante em todos os endereços do clube privado. Na unidade paulistana, são mais de sessenta artistas nascidos, radicados ou treinados no Brasil — boa parte deles moradora de São Paulo.
“Toda vez que abrimos uma casa nova, queremos ter certeza de que fazemos uma coleção bem representativa da cena artística contemporânea do país e, muitas vezes, daquela cidade”, explica Sara Terzi, gerente-sênior de coleções de arte. “Não é como uma configuração de museu, onde você teria que manter distância das peças, então gosto da ideia de poder sentar perto de um quadro tridimensional de Yuli Yamagata”, exemplifica.
Com uma mistura de veteranos e talentos em ascensão, a curadoria feita por Sara durou mais de um ano e inclui obras de Alexandre da Cunha (como um quadro exposto na recepção), Paulo Nimer Pjota e Leda Catunda.
Na seleção, a casa também apresenta um mural surrealista no bar principal, Pernas, pra que Te Quero!, concebido por Marcelo Cipis; uma sala com obras de Gabriel Pessoto, Nazareno e André Azevedo; e gravuras feitas por encomenda de Fernanda Galvão e Nino Cais, dispostas em alguns dos quartos.
Desafio gigantesco
Aberta há quase um mês, a Casa Bradesco começou com um desafio: comportar obras de grandes dimensões que pesam toneladas — marca registrada do artista Anish Kapoor, que assina a mostra inaugural.
“Uma das razões para o Alex (Allard) ter escolhido Anish foi por ele ser reconhecido como um dos artistas mais difíceis de comportar em uma exposição”, explica Benjamin Ramalho, diretor-executivo da vertente de cultura da Cidade Matarazzo.
Segundo ele, as montagens levaram 45 dias após visitas de pelo menos seis equipes de engenharia. O projeto arquitetônico é do ítalo-francês Rudy Ricciotti. “Receber essas obras é uma forma de comprovar a nossa capacidade física e técnica para a exposição de qualquer artista.”
Até o início do ano, o centro cultural ainda deve abrir a sala Acima, um clube de criatividade de 200 metros quadrados voltado para workshops; a sala Ali, feita para atividades infantis; e a Abaixo, salão multiúso para shows, palestras e exposições com capacidade para até 1 500 pessoas. “E teremos um grande painel de LED com mais de 600 metros quadrados, instalado no fundo, nas laterais e no teto”, adianta.
Mesa com requintes
Até os paladares difíceis de agradar encontram abrigo no Rosewood São Paulo. O hotel de luxo tem três restaurantes e dois bares para atender hóspedes e fãs da boa mesa. Cozinha com consultoria de Felipe Bronze, o Taraz faz uma viagem por países sul-americanos em releitura do chef-consultor. Um bom exemplo, a tortilha de banana é para ser recheada pelo cliente com um mix de cogumelos, cebolaroxa, abacaxi tostado, gergelim e coalhada de ovelha (R$ 65,00). A ordem aqui é partilhar.
O Blaise, montado como uma cabana da montanha em homenagem ao escritor suíço Blaise Cendrars (1887- 1961), tem culinária refinada com execução de Fernando Bouzan. Primoroso, o carré de cordeiro vem com tarte tatin salgada de alhoporó (R$ 185,00) — pode ser pedido à la carte ou em um menu degustação (R$ 650,00). Mais informal do trio, o Le Jardin tem a comodidade do funcionamento 24 horas. Vai do café da manhã ao jantar e não deixa ninguém com fome na madrugada.
Embalado por música de qualidade e visual do artista plástico Cabelo, o Rabo di Galo faz caros e caprichados coquetéis, caso do rabo de galo II (cachaças B e Havana 7, vermute tinto e especiarias; R$ 65,00).
O circuito se completa com o bar da piscina, que ilustra a capa desta edição da Vejinha. Na coordenação de todo o segmento está a recém-empossada chef-executiva Rachel Codreanschi. Seu antecessor Felipe Rodrigues está à frente agora da gastronomia do Cidade Matarazzo. (Arnaldo Lorençato)
Publicado em VEJA São Paulo de 4 de outubro de 2024, edição nº 2913